O plano de Roberto Moraes
Lembro ainda como se fosse ontem da minha visitei a Brasília quando da sua inauguração. Todos estavam maravilhados, tirando diversas fotos, era o país do futuro, com uma nova capital futurista. No entanto, poucos sabiam de algo ainda mais incrível: da construção, a poucos quilômetros dali, do Centro de Pesquisas Tecnológicas de Planaltina, conhecido como o Loop brasileiro.
Praticamente o governo norte-americano forçou o presidente Juscelino Kubitschek a aceitar as instalações se quisesse seguir com seus planos, principalmente quanto à indústria automobilística. A Monsanto e outras empresas queriam continuar seu incentivo no desenvolvimento de biotecnologias, entre elas, os agrotóxicos, que estavam sofrendo resistência nos seus países.
A localização central de Brasília, e de Planaltina, oferecia o portão de entrada perfeito para que fossem exploradas a rica fauna, flora e os agronegócio na floresta amazônica, no cerrado e no pantanal. No início, porém, o Loop dos trópicos contou com muitos cientistas bem-intencionados chamados de "verdes", saídos de universidades progressistas dos EUA, liberais europeus e jovens ecologistas brasileiros.
Tudo mudou com a ditadura e alguns sofreram inclusive perseguição, sendo observados de perto. Havia ainda os problemas comuns que um local como aquele causava nos arredores: invenções estranhas que eram descartadas ou surgiram por aí sem saber ao certo o que elas faziam, robôs errantes que tomaram vida própria, fenômenos inexplicáveis, luzes que surgem e desaparecem ao longe, etc.
E foi assim que meu pai, Rodolfo Moraes, perdeu a vida. Uma máquina que deu uma pane, um acidente... mas segundo o pessoal do Loop, tinha sido culpa apenas dele. Minha mãe morreu anos depois, vítima de problemas de saúde pela idade, brigando por pelo menos uma resposta satisfatória. Aqueles canalhas continuaram ainda ceifando mais vidas, como minhas pesquisas enfim concluíram.
Olhei pela janela do quarto e as crianças estavam lá brincando no quintal. Além da cerca, na paisagem mais ao fundo, era possível ver as enormes chaminés do CTPT. Não, não são crianças de verdade, apesar de eu criá-las como sendo... Voltei às minhas anotações, ainda havia esse projeto para terminar. Eu podia sentir que estava perto.
As fotos... Eu devia ter guardado elas em outro lugar para não ser pego nessa maré de lembranças ruins. Mas às vezes elas eram bem necessárias! Aquela mulher me abraçando... Ela havia sido minha primeira paixonite na escola. Nos casamos, mas a pressão por não conseguir ter filhos e a minha obsessão pelos crimes do Loop, ela dizia, acabaram com tudo. Não me lembro quando foi a última vez que tive notícias dela.
Levou anos, mas finalmente estava colocando em prática o que pode ser o primeiro passo para a justiça. O CTPT não podia ignorar meus estudos em física, neurociência, química e engenharia e enfim eu tinha conseguido uma vaga, mas ainda assim não era o suficiente para adentrar os locais mais secretos nos laboratórios. Era lá que descobriria provas dos crimes dele, eu tinha certeza.
Minhas "crianças" serviriam bem para isso. Além da aparência inofensiva, eram programados para serem furtivos, verdadeiros espiões, mas também máquinas para agir como verdadeiras máquinas de combate se necessário. Era realmente difícil de imaginar que aqueles dois brincando num cercadinho de areia fosse capaz disso, mas era apenas questão de acertar alguns detalhes.
Ainda assim, eles precisavam de uma mãe. Soaria tudo mais natural e eles aprenderiam muito em conjunto. Eu me perguntava se criaria uma personalidade do zero e a inteligência artificial iria se aprimorando completamente como tinha feito com os dois lá fora. Mas por fim resolvi adotar partes do que gostava da minha ex-mulher. Afinal, assim ficaria mais fácil o processo de adaptação.
Joguei a caixa com as fotos em um lugar mais ao fundo da garagem. Seria pouco provável que eu encontrasse aquilo novamente sem querer. Iria voltar para o trabalho quando o telefone tocou bem quando eu passava por ele. Atendi rápido. Talvez fosse do Loop.
- Olá, é o doutor Roberto Moraes?
Eu estava certo.
- Sim, pois não?
- Ah, bom dia! Aqui é o do Centro de Pesquisas Tecnológicas de Planaltina. Lamentamos informar que, devido a cortes orçamentários, sua pesquisa não poderá mais ser financiada. Entraremos em contato caso...
Afastei o telefone e não ouvi o resto. Claro, com a inflação do país nas alturas, estavam rifando e sucateando tudo! Fiquei um tempo ponderando e então retornei para a atendente, confusa:
- Tudo bem. Eu agradeço. Tenha um bom dia.
Coloquei no gancho e me virei, lá estavam os meus "filhos" olhando para mim.
- Algum problema, papai?
- Bem, crianças, parece que tudo agora depende exclusivamente de vocês.
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